(Foto: Eric Feferberg/Getty Images) |
Há dez anos e dois dias, o Estádio Paralímpico de Londres ficou calado. Um silêncio absoluto diante de um campeão, para muitos, improvável. O brasileiro Alan Fonteles fez história ao superar o sul-africano Oscar Pistorius naquela edição dos Jogos Paralímpicos.
- A minha saída sempre foi a mais lenta. Inclusive, em Londres, eu não sei por quê, mas foi uma das mais lentas que eu ja fiz, né? Cada passo que eu dava, na minha cabeça vinha “não desiste, não desiste, não desiste". Eu fui encostando nele e, no momento que eu passei dele, pensei “daqui ele não passa mais", aí eu cruzei a linha de chegada! - relembrou Alan Fonteles.
- Foi o momento em que o Brasil, para mim, meteu o pé na porta dos gringos e falou assim: "Cara, nós somos protagonistas!" - explicou Andrew Parsons, presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) à época e atual presidente do Comitê Paralímpico Internacional (IPC, sigla em iglês).
Em apenas 21s45, o protagonista da festa foi eclipsado por um jovem desconhecido pelos narradores da prova, que, surpresos, só conseguiram dizer ao fim dos 200m: "Oh, Meu Deus, Oscar Pistorius perdeu".
- Estavam apresentando os atletas na transmissão ao vivo, mostrando as oito raias, mas continuaram falando do Pistorius quando a câmera foi para o Alan. Eles ignoraram o Alan, nem mencionaram o nome dele. Quando ele [Alan] vence, foi a melhor reação, porque o narrador ficou desconcertado, não sabia o que falar. Ninguém estava preparado para o Pistorius não ganhar aquela prova - recordou o presidente do IPC.
O rosto de Oscar Pistorius estampava os jornais, outdoors e já havia causado burburinho ao figurar entre os atletas olímpicos na eliminatória da prova dos 400m rasos. Ele foi o primeiro esportista biamputado a participar de uma edição dos Jogos Olímpicos. Alan, por outro lado, era ainda pouco conhecido, mas a ascensão do anonimato à fama foi rápida demais.
- A partir daquela vitória ali, no Estádio Olímpico de Londres, o mundo passou a enxergar o Alan com outros olhos. Para a gente é um motivo de muito orgulho! - lembrou o pai, Almir Fonteles.
Antes de sagrar-se campeão em Londres 2012, Alan tinha garantido uma prata no revezamento 4x100, mas nenhuma medalha individual. Em 2013, no Mundial de Lyon, na França, ele chegou como o homem a ser batido, e Oscar Pistorius não estava lá para uma revanche. O sul-africano estava preso aguardando julgamento pelo assassinato da namorada Reeva Steenkamp. Alan aproveitou para bater o recorde mundial nos 200 metros e conquistar o lugar mais alto do pódio nos 100 e 400m.
Mas a luz dos flashes e holofotes ofuscaram a visão daquele jovem de apenas 20 anos. Alan estava no auge, mas a escolha foi sair de cena e se afastar da pista para um período sabático. A notícia foi recebida com surpresa e receio pela equipe técnica que o acompanhava desde as primeiras competições.
- Hoje, talvez eu teria dito pra ele, que ele deveria ter ficado mais focado, não deveria ter se preocupado tanto com a mídia, com o holofote. Tinha muita luz em volta dele, acho que ele não estava preparado pra tanta luz assim em cima dele - afirmou Amaury Veríssimo, ex-treinador de Alan Fonteles.
Foram 365 dias, um ano, parado. Alan ganhou peso, desacelerou e perdeu o posto de campeão em 2015, quando voltou ao Mundial. Em Doha, no Catar, ele ficou com a prata nos 200m, o americano Richard Browne venceu a prova. O tempo passou e junto com ele uma nova percepção aflorou, Alan avalia que parar foi um erro.
- Era tudo, Alan pra cá, Alan pra lá. São coisas da vida do atleta, e hoje analiso e confirmo que eu não soube lidar com aquilo. Foi quando eu parei e deu toda aquela reviravolta. Achei que era a decisão correta a ser tomada, mas, paciência, hoje eu vejo que não foi e agora é continuar um trabalho novo - confessou Alan.
Em uma tentativa de recomeçar após resultados pouco expressivos nos Jogos Rio 2016 e em Tóquio 2021, o paraense decidiu mudar de treinador e cidade. Alan foi em busca de Pedro Almeida, técnico do bicampeão paralímpico Petrúcio Ferreira. Na pista da Universidade Federal da Paraíba, em João Pessoa, Alan está aprimorando a parte técnica e recuperando a confiança para competir em alto nível.
- A volta dele às competições é importante pelo aspecto emocional e psicológico. Eu vejo ele evoluindo a cada dia, a cada mês, criamos uma relação de confiança em busca de um projeto maior - disse o novo técnico, Pedro Almeida.
Desde setembro de 2021, quando voltou de Tóquio sem nenhuma medalha na mala, o velocista não competia. A volta foi no Desafio CPB/CBAT em julho deste ano, um evento que reuniu atletas paralímpicos e olímpicos. Alan não queria uma medalha agora, mas ganhar ritmo para um objetivo maior: disputar a quinta Paralimpíada da carreira em Paris 2024.
- Eu não esqueci do que eu fiz, mas eu recomecei do zero, como se fosse um novo atleta. Estou muito focado e muito dedicado no projeto Paris. Estou me dedicando muito para estar lá!
Globo Esporte
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