Entre as 11 modalidades disputadas nos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas (JMPI), em Palmas, capital do Tocantins, três são chamadas de "esportes ocidentais". É o caso da natação, atletismo e futebol de campo. Todas as outras são encaradas como "jogos nativos".
Alguns desses esportes nativos, no entanto, são disputados nos Jogos Olímpicos e conhecidos pelo público esportivo mundo afora. Os mais disseminados são canoagem, arco e flecha (tiro com arco) e arremesso de lança (lançamento de dardo).
Por que, então, da separação?
"Os esportes ocidentais dominaram o mundo, foi uma forma de globalização dos povos ocidentais, só que cada povo indígena tem seu esporte nativo", explica à reportagem Lucio Xavante, liderança do povo homônimo.
A prática do arco e flecha, canoagem e arremesso de lança, por exemplo, faz parte até hoje do cotidiano das comunidades indígenas. São esportes que aliam entretenimento à sobrevivência. Através deles, além de se divertirem, os povos originários se locomovem, caçam, pescam e guerreiam.
"Não sei se algum dia nós vamos ter o direito reconhecido dos esportes nativos dos povos indígenas, mas a gente tem que lutar por isso. Há várias modalidades que já existiam. A gente tem que buscar esse direito da autoria dos esportes nativos", conta Lucio Xavante ao UOL Esporte.
Nos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, o arco e flecha é o esporte mais badalado. Na prova da modalidade, os participantes têm direito a três tentativas. O alvo - moldado com o desenho de um peixe - fica a 10 metros de distância.
Etnias brasileiras como Karajá, Wai Wai e Javaé, além de representantes da Argentina, Guiana Francesa e Mongólia, participaram da prova. Para Olivier Auguste, guerreiro da etnia Kalinâ, da Guiana Francesa, o nível do arco e flecha é elevado.
"Estou impressionado com o nível dos meus irmãos, que estão usando diferentes tipos de arco e flecha. Sou o melhor na minha aldeia, e estou feliz por ver que vou competir com um nível mais alto do que o meu. Essa é a primeira vez que estou participando de uma competição mundial", disse Olivier.
Para o indígena Paulo Manoel, da etnia brasileira Wai Wai, do Pará, o importante da prova de arco e flecha é justamente a simbologia que a prática traz consigo. "É com isso que nós caçamos, precisamos dele para buscar nosso alimento e acertar um alvo traz muita alegria para nós. Estou feliz em participar desse momento junto com os parentes do Brasil e de povos de outros países", explicou Manoel. É este o significado de esporte nativo.
Tradição e Olimpíada
Alguns dos esportes nativos dos povos indígenas são modalidades indispensáveis nos Jogos Olímpicos. Afinal, quem imagina a Rio-16 sem o atual campeão mundial de canoagem, o brasileiro Isaquias Queiroz? Ele é natural de Ubaitaba, na Bahia, cujo significado em Tupi-Guarani é "cidade das canoas". Pura coincidência?
A canoagem de velocidade, especialidade de Isaquias, está presente na Olimpíada desde os Jogos de 1936, em Berlim. A modalidade slalom foi introduzida depois, em 1972, em Munique. Mas, como sugere o nome da cidade do maior canoísta brasileiro, cuja ocupação dos Tupis data do ano 1000, a canoagem já estava presente na vida dos povos originários muito antes de ser alçado à condição de esporte olímpico.
O tiro com arco - que se assemelha ao arco e flecha – apareceu pela primeira vez nos Jogos de 1990, em Paris. Mas a prática moderna da modalidade, com novos equipamentos e regras, foi inaugurada apenas em 1972, em Munique.
O lançamento de dardo (que é uma lança reta, ou seja, pode ser entendido como arremesso de lança) está presente no imaginário olímpico desde 700 antes de Cristo. O esporte fazia parte do pentatlo nos Jogos Olímpicos da Antiguidade e era disputado em duas modalidades: alvo e distância. Foi integrado à Olimpíada moderna em 1908, em Londres.
Além destes, outros esportes nativos presentes no JMPI se assemelham às modalidades olímpicas, como é o caso das lutas corporais, que lembram o wrestling, cuja prática também remonta aos Jogos Olímpicos da Antiguidade.
"A luta corporal é uma simbologia que nossos avós e tataravós relatavam milenarmente. Isso é uma história que vai passar de pai para filho", finaliza Lucio Xavante, sobre o esporte nativo de seu povo.
UOL Esporte
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