Alemão amputado poderia ganhar medalha na Rio-2016, mas está sendo barrado

(Foto: Reprodução)


Markus Rehm venceu o Mundial de Atletismo paraolímpico com a marca de 8,40 m no salto em distância. Foi o novo recorde mundial para amputados como ele, que não tem a parte inferior da perna direita desde os 14 anos de idade. Com dois centímetros a mais ele teria sido campeão também entre os atletas olímpicos. Ele poderia, então, brilhar na Rio-2016, certo? Nem tanto.

O atleta alemão de 27 anos vive uma polêmica parecida com a de Oscar Pistorius, que antes de 2012 teve de buscar na Justiça o direito de competir com não-amputados. Rehm está a um passo disso. Campeão alemão contra rivais sem deficiência, ele foi impedido de disputar o Campeonato Europeu no ano passado porque a prótese de fibra de carbono supostamente lhe daria vantagem na disputa com saltadores olímpicos.

Desde então, ele não voltou a competir fora do paradesporto. Sua marca impressionante no Mundial de Doha, porém, fez a discussão voltar à tona. O 8,40 m o coloca quase em pé de igualdade com Greg Rutherford, britânico que venceu o Mundial convencional há dois meses com a marca de 8,41 m. Só que Markus Rehm, que perdeu parte da perna em um acidente de wakeboard, divide opiniões em um tema bastante controverso.

Veja, abaixo, quem discorda e quem apoia a participação do alemão nos Jogos Olímpicos:

Contra
Clemens Prokop, 
Presidente da Federação Alemã de Atletismo (DLV, na sigla original):
"Nós apoiamos a inclusão. No entanto, existem dúvidas significativas de que saltar com uma prótese e com um tornozelo normal não são compatíveis", disse ele ao jornal Zeit.

A DLV é, hoje, a maior barreira para Markus. Foi ela quem autorizou que ele participasse do Campeonato Alemão de Atletismo entre os não-deficientes, sob o compromisso de que o torneio seria usado para avaliações a respeito da sua prótese. Ele ganhou a disputa na pista, mas os especialistas entenderam que ele, de fato, levava vantagem sobre os rivais.

Dois fatores pesaram, segundo reportagens do Der Spiegel. O primeiro foi a análise de biomecânicos de que um saltador precisa percorrer 100 m em 10s60 para ganhar força suficiente para saltar 8 m. Rehm alcança essa distância com uma corrida de 11s46, o que indicaria uma capacidade de impulsão fora do normal. Outro indício é o fato de que, na hora do salto, ele ganha uma aceleração vertical muito superior à dos rivais.

Albert Golnhofer, 
Diretor do Instituto de Ciência do Esporte da Universidade de Freiburg
"Está claro que a prótese é uma vantagem", disse ele ao Der Spiegel.

Apesar da declaração taxativa, o especialista ressalta que os testes que foram feitos ainda não são conclusivos. Ele indica que as entidades responsáveis deveriam fazer novos testes, desta vez não em uma competição. Segundo ele, as verificações precisariam ocorrer em um ambiente fechado, sob controle, em que todos os elementos estariam sendo medidos, desde o impacto da prótese no chão até a velocidade adquirida por Rehm e um outro saltador capaz de passar os 8 metros.

O problema é que um teste deste tipo custa caro – mais de dez mil euros, de acordo com a imprensa alemã. E ninguém está disposto a bancar esse valor. Esse impasse, aliás, atrapalha o saltador desde 2012, quando ele foi campeão paraolímpico e passou a pleitear um lugar entre os não-deficientes.

A DLV passou um ano esperando um posicionamento da Iaaf (Federação Internacional de Atletismo, na sigla em inglês), não recebeu nada e decidiu legislar sozinha. Quando o fez, barrando Rehm em 2014, jogou a pendência para a entidade superior. Agora, a Iaaf fala em tomar uma decisão definitiva a respeito antes dos Jogos Olímpicos do ano que vem.

A favor  
Verena Bentele,
Cinco vezes ouro nos Jogos Paraolímpicos e responsável por assuntos de acessibilidade no Governo da Alemanha
"Minha avaliação é que a decisão é um pouco infeliz. Eu teria preferido que a DLV [Federação Alemã de Atletismo] tivesse buscado mais seriamente a inclusão. Teria sido uma decisão mais consistente", disse ao jornal Zeit.

Bentele, assim como vários outros símbolos do movimento paraolímpico, defendem que a integração com atletas sem deficiência é a melhor forma de inserção na sociedade. Antes de 2012, o argumento fez parte da defesa de Oscar Pistorius, que foi alçado ao posto de ícone esportivo após ter sido o primeiro biamputado a disputar uma prova de atletismo convencional na Olimpíada.

Karl Quade,
Presidente do Comitê Paraolímpico Alemão
"É uma pena. Eu acho que a DLV deveria ser mais corajosa, no meu ponto de vista. A investigação não tem uma base sólida", disse ele ao Zeit.

A argumentação do cartola se assemelha à do próprio Markus Rehm e seu treinador. Eles reclamam que a análise feita levou em conta apenas as vantagens, e não apenas as desvantagens ocasionadas pela prótese. Eles defendem que estudos mais profundos podem, no mínimo, deixar a questão em aberto.

A DLV, de fato, não está segura de que existe uma vantagem no uso da prótese. Tanto é que, embora tenha impedido Rehm de disputar o Campeonato Europeu em 2014, manteve seu título alemão.

Markus Rehm
"Eu me ofereço para competir sem disputar medalha. Eu tenho a chance de vencer uma medalha nas Paraolimpíadas, e estou bem com isso. Eu não quero ganhar a medalha se não está claro que eu não tenho uma vantagem. Sou eu que tenho de dormir à noite", disse ele mesmo ao Yahoo.

A opção de disputar a Rio-2016 sem brigar por medalha parece irreal, mas a fala reforça a argumentação do alemão, que diz querer ser um exemplo para outros para-atletas. Rehm defende firmemente que não leva vantagem pela prótese. Um de seus argumentos é o fato de que outros usuários do mesmo material não conseguem resultados tão consistentes quanto os dele.

Tricampeão mundial paraolímpico e medalha de ouro em Londres, ele chega a saltar 1 m a mais que seus concorrentes com deficiência.

UOL Esporte

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