(Foto: Marcos Mendez/Divulgação) |
Quando o Rio de Janeiro foi escolhido como sede das Olimpíadas de 2016, lá atrás em 2009, Torben Grael já dava a letra: era urgente a despoluição da Baía de Guanabara para receber as regatas de vela dos jogos.
Quase seis anos depois, o maior medalhista olímpico brasileiro - ao lado de Robert Scheidt, com cinco pódios - continua seu grito em defesa da raia olímpica brasileira. Hoje diretor técnico da CBVela, Torben Grael não mede palavras para dizer o que pensa a respeito.
"Se continuar a coisa do jeito que está indo, vai ser um vexame enorme, só que está todo mundo achando que vão dar um jeito, o tempo está passando, quanto mais o tempo passa, mais difícil de se resolver. A quantidade de lixo que a gente vê é gigante, realmente é um absurdo. Ninguém gosta de velejar numa água imunda, cheia de lixo, fedorenta, cheia de esgoto", contou Torben ao UOL Esporte, durante o Mitsubishi Motors Soto 40 World Championship, na praia de Jurerê, em Florianópolis.
Em sua opinião, a pouco mais de um ano para a abertura das Olimpíadas, é impossível a despoluição da Baía de Guanabara em definitivo a tempo dos jogos.
"Não é uma coisa que acontece da noite pro dia, tem que fazer uma série de medidas pra remediar isso, você não vai resolver definitivamente. Pra resolver definitivamente o problema do lixo tem que ter coleta decente nos municípios em torno da Baía, vários municípios tem problemas de coleta, principalmente nas comunidades carentes. Então quem não tem coleta faz o quê? Passa num córrego e joga o lixo, quando chove o córrego leva embora, não é porque a pessoa faz de propósito, é porque não tem opção. O primeiro passo é fazer a coleta de lixo", explicou o bicampeão olímpico da classe Star.
"O segundo passo é um paliativo, é ter barreiras pra fazer com que esse lixo não chegue e se espalhe pela Baía. O terceiro passo é o paliativo do paliativo, é catar eventualmente o que a barreira não segurou. Tem que ter medidas emergenciais, como quando tem vazamento de óleo, uma série de coisas pode ser feita pra melhorar o problema do lixo, mas atualmente ninguém faz nada", continuou Grael, sem poupar o poder público estadual ou federal e o Comitê Organizador da Rio-16.
Em fevereiro desse ano, dois velejadores profissionais se acidentaram na Baía de Guanabara ao virar o barco depois de se chocar com resíduos na raia olímpica brasileira. Questionado se a poluição pode colocar em risco a integridade física dos atletas, Torben Grael acredita que o principal problema é outro.
"Acidentes podem acontecer. Mas o problema gravíssimo é trazer uma competição do nível dos jogos olímpicos, que é a mais importante do mundo, e ela ser decidida porque um cara se prendeu num lixo e andou devagar e outro não teve problemas e ganhou a regata. O desempenho desse barcos modernos superleves é muito alto, se botar um saco de lixo lá embaixo o barco anda 20% menos. Eles reclamam que a gente fale agora, mas na hora que chegar nos jogos e o cara perder uma regata por causa de lixo, vai colocar a boca no trombone, aí vai dar merda, o problema vai ser grande."
Família Grael recusa proposta do governo
O objetivo traçado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro em 2009 era claro: limpar 80% da Baía de Guanabara até as Olimpíadas. Apesar disso, o secretário estadual do Ambiente, André Corrêa, e o governador Luiz Fernando Pezão já admitiram que a meta não deve ser cumprida no prazo.
No mês passado, o governo suspendeu dois programas de limpeza da Baía com os ecobarcos e ecobarreiras. Então, a Secretaria Estadual do Ambiente (SEA) e o Comitê Organizador da Rio-16 tentaram contratar a ONG da família Grael, o Instituto Rumo Náutico, para tratar da poluição na raia olímpica.
"O que aconteceu foi que o André Corrêa pediu a mim que desse um encaminhamento para o problema do lixo. O ambientalista e engenheiro florestal fez um projeto fantástico pra encaminhar o problema, apresentou ao André Corrêa, e ele pediu que a gente fizesse a aplicação do programa", disse Grael.
Mas o acordo não se concretizou. E Torben explica por quê. "O fato de que nos últimos seis anos não foi feito nada, não justifica que agora é emergência e pode ser feito sem licitação. O que não é um problema do André Corrêa, que assumiu agora. Então a gente achou que foi a maneira correta de fazer. Se a gente se envolve nisso, sem licitação, o risco institucional era enorme, poderia dar problema com o Tribunal de Contas. Aí entra a frase do Lars [Grael, irmão de Torben, velejador com duas medalhas olímpicas na classe Tornado]: 'não basta ser honesto, tem que parecer honesto'. Então mesmo que você faça tudo direitinho, vai ter sempre gente dizendo que a gente queria tirar dinheiro. Por uma série de motivos tínhamos muito a perder e pouco a ganhar", concluiu Grael, sobre o orçamento de aproximadamente 20 milhões de reais.
A Secretaria Estadual do Ambiente informou em março que prepara um plano de emergência para o evento-teste de vela para a Olimpíada, em agosto. Após a negativa da ONG dos Grael, o governo lançou uma licitação para contratar serviços que garantam a limpeza das águas para as competições olímpicas.
Porém, se em seis anos a despoluição da Baía de Guanabara não avançou como era necessário, fica difícil acreditar que em pouco mais de um ano o prejuízo seja pago. A Baía de Guanabara limpa e apta para receber as regatas de vela da Olímpiada em 2016 – é preciso ver (e navegar) para crer.
UOL Esporte
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