Fenômeno paraolímpico tem ano perdido por indisciplina, chocolate e carne















No dia 2 de setembro de 2012, o Estádio Olímpico de Londres se calou por um momento ao ver um novato derrotar o grande ídolo paraolímpico Oscar Pistorius na final dos 200 m para homens com as duas pernas amputadas. O responsável pela arrancada nos segundos finais da prova tinha 20 anos. O ouro inédito para o Brasil levou Alan Fonteles, até então desconhecido no país, à condição de fenômeno da categoria.

Natural de Marabá, no Pará, Alan ganhou a atenção da imprensa ao competir de igual para igual com Pistorius, e até superá-lo com alguma folga. A vitória de Alan provocou a fúria do rival.

Depois de Londres, o brasileiro consolidou sua hegemonia na categoria. No ano seguinte, quebrou o recorde mundial dos 200 m que pertencia a Pistorius. Venceu também nos 100 m do Open de Berlim, com novo recorde. O sucesso fez Alan sonhar em expandir as fronteiras de sua limitação. Ele chegou a anunciar que tentaria disputar competições com atletas sem deficiência, como Pistorius fizera nas Olimpíadas de Londres.

No auge, o brasileiro seria a grande esperança de medalhas para o Brasil nos Jogos do Rio, em 2016.

Seria. Sua trajetória ascendente deu uma guinada para baixo, e Alan Fonteles acabou se afastando do esporte a partir do fim de 2013, depois de quebrar os recordes mundiais. Ele faltou a treinos e compromissos, o que resultou em perda de parte de seu patrocínio. Até mesmo a disputa do Troféu Brasil, principal torneio do país para atletas sem deficiência, acabou deixada de lado. Ele já decidiu que não participará.

"Fiquei parado, dei um descanso para esses três anos que estão para vir", disse Alan à reportagem. "Tentei a aproveitar a minha vida, ao lado da minha esposa. Eu ia bastante ao cinema, ficava em casa, saía para hotel-fazenda. Mas não fiquei totalmente parado, sempre ia à pista fazer algo. Quando você é atleta deixa muitas coisas por conta dos treinamentos. Eu procurei estar junto com os amigos."

O afastamento trouxe consequências ao corpo dele. Alan está fora de forma, acima do peso ideal. "Ele estava fora das metas estipuladas pela comissão técnica para ele neste ano", comentou o coordenador da seleção brasileira de atletismo paraolímpico Ciro Winckler.

O UOL Esporte conversou com outros atletas paraolímpicos, que disseram que Alan está gordo e faltou a treinos. Eles afirmam que isso diminui suas chances de medalha em 2016.

Meses depois de chegar ao topo do pódio olímpico, o corredor se envolveu em um acidente de trânsito que destruiu o carro que ele dirigia, em Belém. O teste do bafômetro constatou que havia álcool acima do limite permitido em seu sangue. Alan não se feriu com gravidade e chegou a admitir que estava errado.

Bafômetro, chocolate e carne

De lá para cá, ele descuidou da rígida dieta exigida a um atleta de ponta e foi pouco visto nas pistas de atletismo. Em uma entrevista ao jornal "O Globo", depois de seis meses parado, admitiu que estava comendo mais chocolate e carne do que é permitido a um atleta de ponta.

Mas ele acredita que estar acima do peso não vai influenciar no tempo que pode fazer na pista. "Isso não está influenciando nos resultados. Eu estou retomando, preparando o corpo para o ano que vem. Em 1º de janeiro, fevereiro já estarei competindo em alto nível. Já estarei fazendo resultados. Eu estando bem para correr não diferencia em nada."

Mas a interrupção do treinamento já se refletiu no bolso. Alan perdeu o contrato com o Time São Paulo, uma equipe de alto rendimento mantida pelo governo de São Paulo e gerida pelo Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB).

"A não renovação foi uma decisão da própria Secretaria de Estado do Direito à Pessoa com Deficiência, após as ausências do atleta nos treinos e alguns compromissos contratuais, como eventos com o governador do Estado", explicou o CPB via assessoria de imprensa.

"Foi uma surpresa para mim", disse Alan. "Eu acredito que não teve um motivo para ter caído. Mas isso está resolvido. Eu saí do Time São Paulo e consegui outros patrocínios. Isso ficou no passado."

Alan, também neste ano, perdeu uma bolsa do governo do Pará, porque, como mora em São Paulo, não tem mais vínculo com as instituições de seu estado de origem.

Ciro Winckler confia na capacidade de superação de seu atleta e afirma que ele conseguirá entrar em forma a tempo. Mas o tempo não para de correr. Se quiser chegar ao Rio ainda favorito, precisará ser ainda mais rápido do que naquela arrancada impressionante de Londres, em 2012. Ele está treinando em dois períodos, de segunda a sábado, para recuperar o tempo perdido.

"Este é um ano de trabalhar para o próximo. Em fevereiro ou março [de 2015] eu vou estar no meu melhor", afirma ele.

UOL Esporte

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