Sem aeroporto, sem internet, sem imposto: a cota de culpa do governo Dilma

Pela Copa, governo rasgou a Lei de Responsabilidade Fiscal e convidou a Fifa a lucrar sem pagar imposto

Pela Copa, governo rasgou a Lei de Responsabilidade Fiscal e convidou a Fifa a lucrar sem pagar imposto

Em artigo publicado ontem, o UOL mostrou que a maior parte das obras inacabadas ou esquecidas de mobilidade urbana, pontes, trens e viadutos não saíram por culpa, principalmente, dos governos estaduais e municipais. Mas, claro, nem só de mobilidade urbana é feita a Copa. Há um quinhão generoso de responsabilidades sob as costas do governo federal. A União, responsável única e absoluta pelo plano de reforma e ampliação dos portos e aeroportos. A União, que formulou as leis de isenções tributárias à Fifa, que escolheu fazer a Copa em 12 sedes, em vez de dez, em vez de oito. A União, responsável pela infraestrutura de telecomunicações que servirá aos estádios, aos torcedores e à imprensa mundial, que transmitirá o evento ao mundo em tempo real, ou não.

O governo federal, enfim, que é o pai e coordenador de todo projeto da Copa do Mundo no Brasil, para o bem e para o mal. Veja, abaixo, como agiu o governo brasileiro nas principais áreas sob sua responsabilidade.

1 - Volta ao passado, sem Lei de Responsabilidade Fiscal

No dia 14 de janeiro de 2010, um decreto presidencial instituiu um comitê gestor para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa 2014 – CGCopa 2014, coordenado pelo Ministério do Esporte. No mesmo decreto, foi instituído o Grupo Executivo – GECopa 2014, vinculado ao CGCopa 2014, com o objetivo de coordenar e consolidar as ações, estabelecer metas e monitorar os resultados de implementação e execução do Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro.

No mesmo ano, a Medida Provisória 496/2010, que resultou na Lei 12.348 (art. 1º), sancionada pelo Presidente da República em 15 de dezembro de 2010, excepcionaliza o limite de endividamento de Estado e municípios em operações de crédito destinadas ao financiamento de obras e projetos da Copa do Mundo.

Deu para entender? Em nome da Copa do Mundo, o governo brasileiro permitiu que o país regredisse para antes de 2000, quando foi aprovada a Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita o endividamento de União, Estados e municípios. Em nome da Copa, a União permitiu que os Estados tomassem dívidas cujos tomadores não têm a menor ideia de como eles ou as gerações futuras irão pagar.

É o caso, por exemplo, do Estado de Mato Grosso, que fez uso do novo limite de endividamento para custear obras como sua Arena Pantanal de mais de R$ 600 milhões e seu VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) de mais de R$ 1,4 bilhão, e ainda assim não conseguiu bancar tudo, e pediu e obteve mais um alargamento de seu limite de endividamento. 

Para bancar a Copa em Cuiabá, Mato Grosso tomou R$ 1,57 bilhão emprestado. Segundo o Tribunal  de Contas do Estado, o Estado irá desembolsar R$ 250 milhões por ano até 2019, quando as parcelas passarão a cair. O pagamento da conta da Copa só vai acabar para o contribuinte mato-grossense em 2044.

2 - Isenções fiscais, facilidades e exceções para a Fifa

A Medida Provisória 497/2010, que resultou na Lei 12.350, sancionada pelo presidente da República em 20 de dezembro de 2010, criou o chamado Recopa: Regime Especial de Tributação para Construção, Ampliação, Reforma ou Modernização de Estádios de Futebol que serão utilizados nas partidas oficiais da Copa, já contemplados com a mesma desoneração pelos municípios. 

Ficaram ainda concedidas isenções de tributos federais na importação de bens ou mercadorias para uso ou consumo exclusivo na organização e realização da Copa, bem como ficou concedida à FIFA isenção, em relação às atividades próprias e diretamente vinculadas à organização da Copa, de determinados tributos federais (IRRF, IOF, Contribuições Sociais, PIS/PASEP Importação, COFINS Importação, dentre outros).

Ficou claro? Por lei, que é fruto de medida provisória encaminhada ao Congresso Nacional pelo então presidente Luiz Inácio lula da Silva (PT), a Fifa e suas empresas parceiras não pagam imposto no Brasil por nenhuma atividade comercial ligada à Copa.

Depois ainda veio a Lei Geral da Copa, sancionada em 2012. Ela ampliou as isenções fiscais, criou as áreas exclusivas no entorno dos estádios, protegeu as marcas da Fifa, garantiu que a União a ressarciria por eventuais débitos frutos de ações judiciais, desobrigou a entidade a vender meia entrada para estudantes e idosos e liberou a bebida alcoólica em jogos da Copa. 

3 - Aeroportos e o ambicioso plano que não decolou

De acordo com relatório de janeiro de 2011 do CGCopa, "os projetos de aeroportos foram definidos pela Infraero (estatal brasileira que opera os aeroportos), considerando os empreendimentos prioritários para as cidades-sede da Copa". A ideia era investir R$5,6 bilhões. 

O plano previa obras em 14 terminais aéreos, em todas as cidades-sede, incluindo o Santos Dumont e o Galeão no Rio de Janeiro e os aeroportos de Cumbica, em Guarulhos (SP), e de Viracopos, em Campinas (SP). Todas tinham prazo de conclusão até dezembro de 2013.

A exceção era o aeroporto de São Gonçalo do Amarante, na Grande Natal, cujo projeto de construção remonta a 1995 e a previsão de conclusão era abril de 2014. Atualmente, a previsão é de que o terminal passe a operar no próximo sábado, dia 31.

A duas semanas da Copa, sabe-se que pelo menos oito dos 14 terminais certamente não terão concluído as obras prometidas. De acordo com a própria Infraero, estarão inacabadas durante a Copa do Mundo de 2014 as obras dos aeroportos de Belo Horizonte (Confins), Manaus, Rio de Janeiro (Galeão), Curitiba, Cuiabá e Salvador. A reforma dos terminais de embarque desses cinco aeroportos atrasou e acabou sendo dividida em etapas: parte será entregue para o Mundial e parte, só depois do torneio. 

A mesma Infraero desistiu de entregar até o início da Copa a construção da nova torre de controle do aeroporto de Recife e obra de ampliação da pista de pouso e decolagem do aeroporto de Porto Alegre, ambas prometidas para o torneio. Os dois projetos foram retirados da lista oficial de obras para o Mundial. 

Além da divisão das obras em etapas, em alguns terminais, o projeto original foi substituído por versões simplificadas. É o caso de Belo Horizonte, por exemplo. O projeto, que constava na Matriz de janeiro de 2010, dentro de um conjunto de obras orçado em R$ 100 milhões, foi abandonado após duas tentativas fracassadas de licitação feitas pela Infraero no fim de 2012, quando a estatal não conseguiu contratar nenhuma construtora para executar a obra pelo preço desejado.

Assim, a obra, que tinha conclusão prevista para outubro de 2013, foi substituída por outro projeto, mais modesto, de construção de um "terminal remoto", feito com instalações provisórias (apelidado de "puxadinho"),  aproveitando a estrutura já existente do terminal de aviação geral.

4 -  A internet "meia bomba" nas arenas "Padrão Fifa"

A instalação de infraestrutura capaz de garantir a existência de redes de dados 2G, 3G e 4G e wi-fi nos estádios da Copa não está entre as obrigações que o Brasil assumiu com a Fifa para poder receber a Copa. Apesar disso, o governo federal achou por bem "casar" o cronograma de licitação e implantação do 4G com Mundial de futebol. 

No último dia 27, porém, após mais de três anos garantindo que a instalação dos equipamentos de telecomunicações nos estádios da Copa seguiam dentro do esperado e que não havia motivo para preocupações, o governo admitiu que o serviço de internet e telefonia móvel em geral para os torcedores "vai ficar lento" em seis dos 12 estádios da Copa.

De acordo com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, haverá problema e congestionamento no tráfego de dados nas arenas que não contarão com redes wi-fi internas, mesmo com a instalação de antenas de reforço para sinal de 2G, 3G e 4G.

"Mesmo com as antenas, vai ficar lento, são milhares de pessoas usando o serviço, enviando fotos ao mesmo tempo", avisou o ministro. "Vai ficar lento. Queríamos wi-fi em todos os estádios, mas em seis deles não houve acordo entre as operadores e as administradoras das arenas", tentou justificar o ministro, como se não não tivesse tomado para si a responsabilidade de garantir a instalação dos sistemas.

Itaquerão (São Paulo), Arena da Baixada (Curitiba), Arena das Dunas (Natal), Mineirão (Belo Horizonte), Arena Pernambuco (região metropolitana do Recife) e Castelão (Fortaleza) não terão wi-fi, ao contrário do que planejou e prometeu o governo.

UOL Esporte

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