Engenhão completou em março um ano de interdição - em 2013, o estádio foi fechado por problemas estruturais e risco de desabamento com ventos fortes
Há um ano, o futebol carioca recebia uma notícia com total perplexidade: o fechamento do Estádio João Havelange, o Engenhão, por problemas estruturais na cobertura da arena. Foram quase três meses sem nenhum estádio grande no Rio de Janeiro capaz de abrigar clássicos, já que o Maracanã só foi reaberto aos clubes brasileiros no dia 21 de julho, algumas semanas depois do fim da Copa das Confederações.
Construído para os Jogos Pan-Americanos de 2007 e inaugurado no dia 30 de junho daquele ano, o Complexo do Engenhão foi orçado em R$ 60 milhões e com previsão de entrega para o fim de 2004. Mas só foi aberto quase três anos depois e seu custo final saltou para R$ 380 milhões, pagos com dinheiro público.
Apenas o campo anexo do Engenhão é liberado para os treinos do Botafogo
Após o Pan, o Botafogo arrendou o estádio pelo prazo de 20 anos, com a possibilidade de renovação por mais 20. Foram seis anos de casa nova e uma renda a mais nos cofres do clube, mas desde o ano passado a equipe amarga prejuízos com a interdição.
O presidente do Botafogo, Mauricio Assumpção, afirmou que o departamento financeiro e jurídico do clube está fazendo um levantamento dos prejuízos e que cobrará a conta de alguém.
"Pode ter certeza de que alguém vai pagar essa conta, o Botafogo não ficará no prejuízo. Nossos departamentos financeiro e jurídico estão cuidando dessa questão com cuidado, para saber de quem é a responsabilidade e os valores", disse o presidente alvinegro.
Assumpção acredita na reabertura do estádio ainda em 2014. Conforme cronograma repassado pela prefeitura do Rio e o Consórcio Engenhão (formado pelas empresas Odebrecht e OAS), que administra as obras, a arena deverá ser entregue ao clube de General Severiano em novembro deste ano.
"Alguns veículos de imprensa estão falando que o Engenhão será entregue só em 2015. Não contamos com essa data. A prefeitura nos passou que em novembro de 2014 teríamos o estádio de volta, e é com isso que contamos para voltar a abrigar os nossos jogos em casa", afirmou Assumpção.
Diretoria do Botafogo espera ter o estádio de volta ainda em 2014
Embora o laudo elaborado pela empresa alemã SBP, que apontou risco de queda da cobertura em caso de ventos acima de 65 km/h, tenha sido anunciado em março de 2013, as obras só começaram quatro meses depois, em julho, quando o Consórcio Engenhão apresentou à RioUrbe um projeto para o reforço da cobertura do estádio.
Em novembro de 2013, o Consórcio Engenhão desmobilizou 114 operários que atuavam na desmontagem parcial da cobertura. Segundo a assessoria da empresa, o trabalho das pessoas demitidas consistia na retirada de toda a parte elétrica que alimentava a estrutura de som e iluminação do estádio, bem como o catwalk (passarelas). Na ocasião, foram retirados os 390 refletores, as luminárias e caixas de som. De acordo com o consórcio, todo o material retirado está guardado e será preservado para reutilização. Atualmente, as obras contam com 305 funcionários.
Com o problema da cobertura e a interdição, a utilização do estádio como centro de treinamento para alguma seleção durante a Copa do Mundo foi descartada. O time do Botafogo apenas utiliza o campo anexo para treinos. Os jogos do time são realizados no Maracanã desde agosto de 2013, quando o clube assinou uma parceria com a concessionária que administra o estádio.
Estádio nos planos dos Jogos Olímpicos de 2016
O Engenhão foi construído para abrigar as competições de atletismo e futebol dos Jogos Pan-Americanos de 2007. Com a interdição do Maracanã em 2010, devido às obras da Copa do Mundo de 2014, a arena virou o principal palco do futebol carioca. E para 2016, a prefeitura do Rio, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e a Empresa Olímpica Municipal (EOM) contam com o complexo para realizar as provas de atletismo da Olimpíada.
Engenhão foi interditado em março de 2013 por problemas estruturais
Para adequar o aparelho às necessidades olímpicas, serão necessárias novas intervenções em 2015, mas sem a necessidade de fechamento, segundo o prefeito Eduardo Paes. Além das modificações e adequações dentro do estádio, serão realizadas obras no entorno, com novos acessos que facilitarão a entrada e a saída do público. A conclusão estimada é para o primeiro trimestre de 2016.
Em 2011, Eduardo Paes baixou um decreto relacionando mais de cem imóveis no entorno do estádio que seriam desapropriados, para que fosse feito o alargamento de ruas nos arredores. Na ocasião, os moradores argumentavam que o decreto coincidia com um movimento de especulação imobiliária na região.
Em abril de 2013, outro decreto do prefeito que tratava da desapropriação do entorno do Engenhão retirou os imóveis do lado par da Rua das Oficinas, assim como de outros imóveis em ruas próximas. Segundo a assessoria de imprensa da Secretária Municipal de Obras (SMO), não será mais necessário fazer o alargamento das vias, e sim apenas uma reurbanização para receber o público para os Jogos Olímpicos.
"Estas vias não serão alargadas, apenas reurbanizadas, nos moldes do programa Bairro Maravilha Norte, que providenciará recuperação do pavimento, construindo sarjetas, calçadas, reparando a rede de drenagem, implantando rampas de acessibilidade e sinalização horizontal em 34 vias do bairro, incluindo estas mencionadas", informou a SMO em nota. "Os imóveis foram excluídos do decreto porque não precisarão ser desapropriados. A área de interesse da Copa e dos Jogos de 2016 concentra-se na Rua das Oficinas, onde a SMO já entregou o Viaduto da Abolição, importante obra de mobilidade, fundamental para acesso e evacuação do estádio".
Fechamento do estádio leva drama a moradores da região
Já os moradores que terão que abandonar suas casas têm outra resposta para a exclusão de alguns imóveis, principalmente os que ficam do lado par da via, que não precisarão mais ser demolidos.
"É só olhar para a sua frente para saber por que tiraram do decreto o lado par da Rua das Oficinas", falou um morador que pediu para não ser identificado, apontando para a construção de um condomínio com apartamentos de dois quartos sendo vendidos por aproximadamente R$ 340 mil cada.
Já Ione Alves, 36 anos, comerciante, viúva e mãe de três crianças, não teve a mesma sorte do vizinho do outro lado da rua. Moradora da Rua das Oficinas há dez anos, quando se casou e foi viver nos fundos da casa da sogra (que está no local há mais de três décadas), a agora desempregada está em desespero, sem saber para onde ir. Ela teve que fechar seu pequeno bar por causa dos prejuízos com a interdição do Engenhão.
"Meu marido morreu de câncer no fim de 2012, acreditando que estava deixando uma boa fonte de renda para mim e para os nossos filhos. Mas em março (de 2013), quando o Engenhão foi fechado, começou o meu pesadelo. Em novembro veio um pessoal da prefeitura fazer algumas medições e dizendo que seríamos notificados para desocuparmos as nossas casas, porque eles desapropriariam tudo. Para onde eu vou com a minha família?", indagou Ione, com os olhos cheios de lágrimas.
O bar de Ione fica na parte da frente do terreno do imóvel, que abriga, além dela, mais familiares de seu falecido marido. A casa da família fica ao lado da entrada norte da arena. Quem olha por fora não imagina que o local está fechado há um ano. E dentro a situação não é muito diferente: tudo está exatamente como quando o local precisou fechar as portas. No freezer ainda há latas de cerveja, refrigerantes e águas. Pelos balcões há salgadinhos, guloseimas, entre outras mercadorias, aguardando um recomeço.
Já Cileide Geraldo, 62 anos, e Seu Pereira, 72, possuem um bar ainda aberto na esquina da Rua das Oficinas com a Rua José do Reis. Mas com o futuro incerto por causa da desapropriação e o faturamento praticamente no vermelho, já que o movimento caiu mais de 90% desde que o estádio foi fechado para as obras, estão apavorados com a possibilidade de ficar sem a pouca fonte de renda que possuem.
"Aqui somos inquilinos, ou seja, a prefeitura desapropriando tudo, nós não receberemos nada. E hoje em dia é impossível eu conseguir alugar alguma coisa para continuar trabalhando, pois os preços dos aluguéis estão absurdos. Não tenho mais idade para voltar a trabalhar na rua", desabafou dona Cileide, que trabalhou por muitos anos como ambulante e não quer mais voltar a vender balas e chocolates no centro do Rio de Janeiro.
Terra
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